terça-feira, 18 de junho de 2019

LÁGRIMAS OCULTAS

Se me ponho a cismar em outras eras 
Em que ri e cantei, em que era querida, 
Parece-me que foi noutras esferas, 
Parece-me que foi numa outra vida ...

E a minha triste boca dolorida, 
Que dantes tinha o rir das primaveras, 
Esbate as linhas graves e severas 
E cai num abandono de esquecida!

E fico, pensativa, olhando o vago ... 
Toma a brandura plácida dum lago 
O meu rosto de monja de marfim ...

E as lágrimas que choro, branca e calma, 
Ninguém as vê brotar dentro da alma! 
Ninguém as vê cair dentro de mim!


Florbela Espanca, Livro das Mágoas

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